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Portfolio

MENTALIDADE COLONIAL

São Paulo, Brasil
2019 - 2020
texto de Paulo Kassab Jr.

Quanto vale?

O que George Washington, a Princesa Isabel, Nelson Mandela, a Rainha Elisabeth, Simón Bolívar e Luiz de Camões têm em comum?

Além do reconhecimento histórico, talvez apenas a rápida apropriação do ícone e seu simbolismo pelo capitalismo.

O sistema aceita tudo, toma como seu e oferece em troca pequenas concessões em nome, é claro, da manutenção contínua do privilégio.

Qualquer imagem, discurso ou escrita, se torna um produto, uma posse, dinheiro. A famosa fotografia de Che Guevara, de Alberto Korda, agora está em caixas de sorvete, maços de cigarro e bandeiras de times de futebol. Se o uso da imagem pela indústria desloca e esvazia o símbolo, quando tomada pelo Estado, ela se torna uma estratégia para, desde criar a personificação de um país, até disfarçar um acerto de contas com seu passado racista e colonialista. Enfeitadas com frases, insígnias e imagens históricas, as cédulas são um dos símbolos mais explícitos da identidade de uma nação, ou da falsa realidade construída e mascarada na democracia. Consciente da capacidade humana de esquecimento e apagamento sistemático da memória, o mesmo país que há anos bane, ignora e massacra seus povos originários inclui em suas cédulas e moedas os rostos dos índios, do cacique Tibiriçá (cem réis - 1932), aos carajás (mil cruzeiros - 1990). Hoje, enquanto nossas florestas queimam em nome do dinheiro e do agronegócio, os projetos de lei celebram o beija-flor, a arara, a onça-pintada, a garoupa e o lobo-guará.

O capital não se importa com suas contradições, ele simplesmente usurpa conceitos, desde que possa se beneficiar deles com ganho de patrimônio social, cultural ou financeiro. Todo movimento é pensado para manter o status quo com ares de transformação social. E o muro se ergue, invisível. Ele separa, segrega, elege o velho com roupagem nova e nome novo.

"Mentalidade Colonial" são fotografias de cédulas de dinheiro que fazem parte da série "Sobre Muros", na qual investigo diferentes fronteiras: psíquicas, culturais, sociais e, principalmente, financeiras. Enquanto o muro marca a assimetria, materializa a diferença e o desequilíbrio produzidos por uma separação muitas vezes desejada e sofrida, o dinheiro engana, exclui, compra sonhos e constrói distâncias para perpetuar o sistema.

Não por acaso, este foi o primeiro conjunto de imagens escolhido pelo artista entre tantos outros que exploram uma realidade mundial reduzida a uma clara distinção entre "nós" e os outros", entre dentro e fora, entre amigo e inimigo. Entre o bom e o mau, conhecido e desconhecido, rico e pobre, seguro e arriscado, desejado e indesejado. Emoldurados, colocados lado a lado em caixas, os rostos falam de poder, ficção, história e, sobretudo, falam da invenção do capital como principal fronteira, muito além dos muros físicos, mas também seu patrocinador. Em 2021, enquanto milhões passam fome e fazem fila por ossos, a veneração a um hediondo boi de ouro, cópia barata de Wall Street, só confirma: estamos murados.

Julio Bittencourt | Rua Pará, 126 01243-020. | São Paulo, Brasil | 07.839.605/0001-10 | Envio: 14-28 dias úteis

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